Introdução
Imagine um jovem diagnosticado com leucemia linfoblástica aguda refratária, que já passou por diversas linhas de quimioterapia sem sucesso.
Em meio ao desespero, uma esperança surge: o tratamento com Kymriah (Tisagenlecleucel), uma terapia gênica revolucionária baseada em células CAR-T. No entanto, o custo desse tratamento é exorbitante e inacessível para a maioria das famílias brasileiras.
Diante disso, surge a questão: é possível obter o Kymriah pelo SUS ou pelo plano de saúde?
Neste artigo, vamos explicar os caminhos legais disponíveis para o acesso ao medicamento, abordando aspectos técnicos, jurídicos e práticos, incluindo o entendimento dos tribunais, a possibilidade de liminar e o papel dos advogados especializados.
Para que serve o Kymriah (Tisagenlecleucel)?
Kymriah é uma terapia de células CAR-T (Chimeric Antigen Receptor T-Cell), indicada principalmente para:
- Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA) de células B em pacientes até 25 anos que sejam refratários ou tenham recaída após transplante.
- Linfoma Difuso de Grandes Células B (DLBCL) em adultos, após pelo menos duas linhas de tratamento prévias.
O Kymriah funciona ao reprogramar geneticamente os linfócitos T do próprio paciente para reconhecer e destruir células cancerígenas.
É um tratamento de alta complexidade e custo elevado, mas que oferece uma alternativa de cura ou remissão em casos graves e resistentes a terapias convencionais.
É possível obter o Kymriah pelo SUS?
Sim, é possível obter o Kymriah pelo SUS, com a ajuda de um advogado especialista em ações contra o Sistema Único de Saúde.
O SUS é constitucionalmente obrigado a fornecer medicamentos de alto custo para doenças graves e que coloquem em risco a vida do paciente, como é o caso de certos tipos de câncer hematológico.
Por se tratar de uma terapia de altíssimo custo (chegando a mais de R$ 2 milhões por aplicação), o fornecimento administrativo pode ser negado ou postergado.
Nessas situações, é possível ajuizar uma ação judicial com pedido de liminar (tutela de urgência) para obrigar o SUS a custear o tratamento, desde que o paciente apresente:
- Prescrição médica detalhada;
- Relatórios comprovando a necessidade do tratamento;
- Laudos demonstrando que outras terapias foram ineficazes;
- Registro da Anvisa (o Kymriah é registrado no Brasil desde 2020).
É possível obter o Kymriah pelo plano de saúde?
Sim, os planos de saúde também são obrigados a cobrir o custo de medicamentos de alto custo, como o Kymriah, conforme determina a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
No entanto, é comum que operadoras neguem esse tipo de cobertura, alegando que o medicamento não está previsto no rol de procedimentos da ANS.
Apesar disso, o entendimento jurisprudencial é claro: se o tratamento for prescrito por um médico responsável e for essencial para a saúde do paciente, o plano deve cobrir.
Muitos pacientes, munidos de laudos médicos, têm recorrido à Justiça com sucesso para obter o Kymriah via plano de saúde. A recomendação é sempre contar com a atuação de um advogado especializado em plano de saúde.
Os planos de saúde só devem cobrir o que está no rol da ANS?
Não.
O rol da ANS é exemplificativo, e não taxativo. Isso significa que os planos de saúde não estão limitados apenas aos tratamentos listados pela ANS.
A jurisprudência majoritária dos tribunais brasileiros entende que, se o medicamento é necessário para o tratamento da doença coberta pelo plano e há prescrição médica fundamentada, a cobertura é devida.
Conforme explica o advogado Dr. Evilasio Tenorio, especialista em Direito da Saúde, e advogado especialista no Direito das Pessoas com Doenças Graves:
“O rol da ANS não é taxativo, e sim exemplificativo. Se um paciente necessita de um medicamento ou tratamento que não está listado no rol, mas que é essencial para a sua condição de saúde e possui fundamentação médica adequada, o plano de saúde tem a obrigação de fornecer esse tratamento. A jurisprudência tem reconhecido a natureza exemplificativa do rol, garantindo que a cobertura vá além do que está listado, sempre que necessário para a saúde do paciente.”
A negativa do fornecimento do medicamento pode ser considerada abusiva?
Sim.
A negativa do fornecimento de medicamentos essenciais à vida e à saúde do paciente pode ser considerada abusiva, à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O artigo 14 do CDC estabelece que o prestador de serviços responde pela falha na prestação, ainda que sem culpa.
Nos casos em que há prescrição médica fundamentada e comprovação da eficácia do medicamento para o quadro clínico do paciente, a negativa de cobertura representa uma violação do direito à saúde e à dignidade da pessoa humana, ensejando responsabilização judicial da operadora ou do SUS.
O processo judicial demora?
Todo processo judicial tem certa demora, mas nos casos que envolvem medicamentos de alto custo e risco à vida, é possível conseguir uma liminar (tutela de urgência) que assegure o fornecimento do Kymriah antes da sentença final.
O Poder Judiciário tem tratado esses casos com prioridade, especialmente quando o paciente apresenta laudos médicos que demonstram urgência e gravidade.
A liminar, quando concedida, obriga o plano ou o SUS a fornecer o medicamento imediatamente, evitando que o paciente fique desassistido.
Como fazer em caso de negativa?
Em caso de negativa, o caminho mais seguro e eficaz é buscar um advogado especializado em ações de saúde.
Esse profissional poderá reunir toda a documentação necessária e ingressar com uma ação judicial com pedido de liminar, buscando garantir o fornecimento rápido do medicamento.
É essencial apresentar:
- Relatório médico detalhado;
- Prescrição com justificativa técnica;
- Comprovação de outras terapias ineficazes;
- Documentos do plano de saúde ou do SUS com a negativa formal.
Uma liminar demora muito?
Geralmente, não.
As liminares em ações de saúde são analisadas com urgência pelos juízes, muitas vezes em menos de 48 horas após o ajuizamento da ação.
Isso ocorre porque a ausência do medicamento pode colocar em risco a vida do paciente, o que justifica o atendimento célere pelo Judiciário.
Conclusão
O Kymriah representa um avanço promissor no tratamento de cânceres hematológicos graves, mas seu alto custo impede o acesso de muitos pacientes.
Felizmente, tanto o SUS quanto os planos de saúde podem ser judicialmente obrigados a custeá-lo.
O apoio de um advogado especialista em Direito da Saúde é fundamental para garantir esse direito, sobretudo diante de negativas injustificadas ou da urgência do quadro clínico.
Estar bem informado e preparado juridicamente pode fazer toda a diferença na hora de garantir um tratamento que salva vidas.