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SUS pode negar medicamento indicado por médico particular? Entenda seus direitos

Receita de médico particular vale no SUS? Saiba que mesmo com laudo médico particular, o SUS deve garantir o acesso a medicamentos essenciais quando cumpridos os requisitos legais. Saiba como agir diante da negativa.
Mesmo com laudo médico particular, o SUS deve garantir o acesso a medicamentos essenciais quando cumpridos os requisitos legais. Entenda o que diz a jurisprudência e como agir diante da negativa.

Muitos pacientes se deparam com uma situação delicada: possuem um laudo médico particular indicando um medicamento essencial, mas enfrentam a negativa de fornecimento por parte do SUS.

Essa recusa é legal? O médico precisa, obrigatoriamente, ser do SUS para que o tratamento seja atendido? 

Neste artigo, vamos esclarecer esse impasse, com base na legislação e no entendimento dos tribunais.

 

O que diz a legislação sobre fornecimento de medicamentos pelo SUS

O Sistema Único de Saúde (SUS) tem a responsabilidade de garantir o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica, conforme previsto no artigo 196 da Constituição Federal.

Isso significa que, sempre que houver necessidade médica comprovada, o Estado deve fornecer os medicamentos indispensáveis à saúde do paciente.

Contudo, o fornecimento de medicamentos pelo SUS obedece a alguns critérios, como a inclusão do remédio nos protocolos clínicos e nas listas padronizadas do Ministério da Saúde.

 

O papel do laudo médico e a origem da prescrição

Uma dúvida comum é se o laudo médico precisa ser emitido, obrigatoriamente, por um profissional da rede pública.

A resposta é não.

O entendimento majoritário dos tribunais brasileiros é que a origem do laudo – se pública ou privada – não pode ser usada como justificativa para negar o fornecimento do medicamento, desde que o laudo seja completo, técnico e justifique a necessidade do tratamento.

No julgamento do Mandado de Segurança nº 2263347-20.2021.8.13.0000, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reafirmou que, comprovada a necessidade do medicamento, mesmo por laudos médicos particulares, é dever do Poder Público assegurar ao paciente o tratamento adequado à melhora da sua qualidade de vida:

MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO – ADMINISTRATIVO – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PADRONIZADO – LAUDOS PARTICULARES – COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DO FÁRMACO – MULTA DIÁRIA – FIXAÇÃO CONTRA ENTE PÚBLICO – POSSIBILIDADE – RETENÇÃO DE RECEITA MÉDICA ATUALIZADA – RAZOABILIDADE. 1. O fornecimento de medicamento incorporado às listas oficiais do SUS depende da comprovação da necessidade do fármaco e da sua eficácia para o tratamento. 2 . Comprovada a necessidade do medicamento postulado, ainda que por laudos médicos particulares, é dever do Poder Público assegurar ao paciente o tratamento adequado à melhora da sua qualidade de vida. 3. É possível a fixação de multa cominatória contra a Fazenda Pública para garantir o cumprimento da obrigação de fazer. 4 . O fornecimento do fármaco pode ser condicionado à apresentação de relatório médico atualizado, porque é medida razoável para evitar a utilização indevida dos insumos postulados.(TJ-MG – Mandado de Segurança: 22633472020218130000, Relator.: Des.(a) Carlos Henrique Perpétuo Braga, Data de Julgamento: 26/09/2024, Câmaras Cíveis / 19ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/10/2024)

O Tribunal de Justiça de Roraima, no Recurso Inominado nº 0820337-28.2023.8.23.0010, também abordou diretamente a questão, afirmando que não há exigência de que a receita seja emitida por médico do SUS. A decisão destacou que a escolha do medicamento deve ser feita por um médico habilitado, independentemente de ser da rede pública ou privada, desde que atendidos os requisitos legais, como a comprovação da necessidade do medicamento e sua eficácia para o tratamento:

JUIZADO ESPECIAL. RECURSO INOMINADO. DIREITO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. TRATAMENTO DE URTICÁRIA CRÔNICA. TEMA Nº 106 DO STJ. NÃO HÁ EXIGÊNCIA DA RECEITA POR MÉDICO DO SUS. ALÉM DISSO FOI APRESENTADO O LAUDO DA MÉDICA DERMATOLOGISTA DO SUS ACOMPANHADO DO LAUDO DA MÉDICA PARTICULAR. REQUISITOS DO TEMA Nº 106 DO STJ ATENDIDOS. INCLUSIVE A JUSTIÇA FEDERAL JÁ PERMITIU O TRATAMENTO COM O MEDICAMENTO OMALIZUMABE PARA URTICÁRIA CRÔNICA. DEVER DE FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO PELO ESTADO . RECURSO PROVIDO. (TJ-RR – RI: 0820337-28.2023.8 .23.0010, Relator.: DANIELA SCHIRATO COLLESI MINHOLI, Data de Julgamento: 05/04/2024, Turma Recursal, Data de Publicação: 08/04/2024)

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgInt no RMS 61977 GO 2019/0298817-3, reafirmou que laudos médicos elaborados por médicos particulares são admissíveis como prova para o fornecimento de medicamentos, por parte do Estado:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA . TRATAMENTO SUGERIDO POR LAUDO MÉDICO ELABORADO POR MÉDICO PARTICULAR. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA VÁLIDA. PRECEDENTES. TEMA 106/STJ . REQUISITOS CUMULATIVOS. REGULAR PROCESSAMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA. PROVIMENTO NEGADO. 1 . A jurisprudência desta Corte Superior possui entendimento segundo o qual, para fins de mandado de segurança, é admissível como prova constituída laudo médico elaborado por médico particular, atestando a necessidade do uso do medicamento, para se demonstrar o direito líquido e certo capaz de imputar ao Estado o seu fornecimento gratuito. 2. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.657 .156/RJ, submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 106/STJ), entendeu haver obrigatoriedade de o poder público fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS quando verificada a presença cumulativa dos seguintes requisitos:”i) comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência” (relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 25/4/2018, DJe de 4/5/2018). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – AgInt no RMS: 61977 GO 2019/0298817-3, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 30/10/2023, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/11/2023)

A finalidade do laudo é comprovar a condição de saúde do paciente e a recomendação terapêutica. Se o médico, mesmo da rede privada, atendeu o paciente, avaliou seu quadro clínico e prescreveu o tratamento, isso deve ser considerado.

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Mesmo com laudo médico particular, o SUS deve garantir o acesso a medicamentos essenciais quando cumpridos os requisitos legais. Entenda o que diz a jurisprudência e como agir diante da negativa.

 

Documentos necessários para solicitar medicamentos no SUS

Apesar de o laudo médico particular ser aceito, é importante que ele esteja bem elaborado. O ideal é que contenha:

  • Diagnóstico completo;
  • CID (Classificação Internacional de Doenças);
  • Justificativa para o uso do medicamento solicitado;
  • Informações sobre ineficácia ou efeitos colaterais de medicamentos disponíveis no SUS, se for o caso;
  • Assinatura, carimbo e CRM do profissional.

Além do laudo, normalmente são exigidos documentos pessoais do paciente, comprovante de residência, cartão do SUS e exames que comprovem a necessidade do medicamento.

 

O que fazer em caso de negativa com receita particular

Se o paciente tiver todos os documentos em ordem e, ainda assim, o SUS negar o fornecimento do medicamento com a justificativa de que o laudo é de médico particular, é possível:

  1. Registrar uma reclamação na Ouvidoria do SUS (telefone 136);
  2. Procurar um advogado especialista em conseguir medicamentos, para obter orientação e eventual ingresso de ação judicial.

Dicas práticas para garantir o acesso ao tratamento

  • Mantenha todos os documentos organizados e atualizados.
  • Peça ao médico que detalhe a necessidade do medicamento e os riscos da não utilização.
  • Faça a solicitação formal por escrito e peça um protocolo de atendimento.
  • Se houver negativa, peça para que seja registrado por escrito o motivo da recusa.

Conclusão

O direito à saúde é um dos pilares fundamentais assegurados pela Constituição Federal. Isso significa que todo cidadão brasileiro tem direito a um tratamento adequado, digno e eficaz – e isso inclui o acesso a medicamentos essenciais, mesmo quando prescritos por médicos da rede privada.

A negativa do SUS com base apenas na origem do laudo médico não se sustenta juridicamente, desde que o documento esteja devidamente fundamentado e com todos os requisitos técnicos necessários.

No entanto, é comum que o paciente enfrente dificuldades burocráticas ou até negativas infundadas por parte do poder público. Nesses casos, é fundamental agir com rapidez e estratégia. Buscar orientação jurídica adequada pode ser o diferencial entre conseguir o medicamento a tempo ou sofrer com o agravamento da própria condição de saúde.

Por isso, ao se deparar com uma recusa por parte do SUS, o ideal é procurar o apoio de um advogado especializado em Direito da Saúde, com experiência em ações de fornecimento de medicamentos. Esse profissional poderá avaliar a documentação, orientar sobre os melhores caminhos (seja na via administrativa ou judicial), e atuar de forma técnica e assertiva para garantir o cumprimento do direito à saúde.

Mais do que conhecer a lei, é essencial saber como aplicá-la em cada caso. Contar com o suporte de um especialista é garantir não só um atendimento jurídico eficiente, mas também um cuidado real com a saúde e a dignidade do paciente.

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